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A Nova Estratégia Econômica dos EUA e os Reflexos para o Brasil

O dilema americano: o peso dos déficits gêmeos

Os Estados Unidos vivem um momento de profunda reflexão econômica e geopolítica. Há algum tempo, o país vem se debruçando sobre o que seus economistas e estrategistas chamam de déficits gêmeos: o déficit fiscal e o déficit comercial, que juntos somam cerca de 3 trilhões de dólares por ano.

De um lado, o déficit fiscal norte-americano chega a 2 trilhões de dólares anuais, um rombo que vai direto para a dívida pública e começa, pela primeira vez, a gerar desconfiança entre as agências de risco internacionais. De outro, o déficit comercial – a diferença entre o que os EUA importam e exportam – já ultrapassa 1 trilhão de dólares anuais.

Esses dois déficits criam um desafio existencial para a economia americana: o país depende, essencialmente, da confiança global no dólar. É essa crença mundial na moeda americana como reserva de valor e instrumento de troca internacional que permite aos EUA financiar seus desequilíbrios sem colapsar. Qualquer tentativa de deslegitimar o dólar, seja por retórica política, bravata ou estratégias alternativas, será enfrentada com retaliações severas e preventivas — pois trata-se, nas palavras do palestrante, de “questão de vida ou morte” para o sistema americano.


Trump e a política industrial de combate ao déficit comercial

Para enfrentar esse cenário, o ex-presidente Donald Trump adotou uma política industrial e comercial agressiva. Sua meta central é reverter o déficit comercial e forçar o retorno de investimentos e indústrias ao território americano.

Trump busca repatriar empresas que transferiram suas fábricas para a China, Vietnã, Índia, Brasil e outros países. A ideia é clara: reduzir a dependência externa e reconstruir a base industrial nacional. Essa estratégia — considerada “política industrial na veia” — é algo que, segundo o palestrante, o Brasil já soube fazer nas décadas de 1950 a 1970, mas abandonou após a crise dos anos 1980, perdendo sua capacidade de planejar o desenvolvimento de forma estratégica.

O contraste é evidente: em 1980, o PIB do Brasil era equivalente ao da China. Hoje, o PIB chinês é cerca de 20 vezes maior, resultado de uma política industrial consistente e oposta à brasileira nas variáveis macroeconômicas.


O efeito interno: retórica, distração e cálculo político

O discurso de Trump, segundo a análise, vai além da economia. Ele usa narrativas políticas e simbólicas — como a crítica à perseguição judicial de líderes conservadores no exterior — para buscar apoio interno e alianças ideológicas.

Um exemplo citado é a carta enviada a Lula, na qual Trump relaciona a suposta perseguição jurídica ao ex-presidente Jair Bolsonaro com injustiças políticas. O verdadeiro objetivo, segundo o palestrante, seria manipular a opinião pública brasileira e fortalecer sua base de apoio para medidas econômicas que, na prática, prejudicam o Brasil.

Essa retórica, porém, pode gerar um efeito contrário: ao atacar, Trump acabou oferecendo a Lula a oportunidade de se colocar como defensor da soberania nacional — uma narrativa que, até então, o presidente brasileiro não possuía.


Uma nova era nas relações comerciais internacionais

O mundo, observa o palestrante, está diante de um novo padrão de relacionamento comercial internacional. Para o Brasil, compreender e se adaptar a essa mudança é fundamental.

A administração Trump implementou medidas de aumento de tarifas e restrição de importações com resultados imediatos: em apenas sete meses de governo, arrecadou US$ 152 bilhões extras, o que representou quase 7% de compensação sobre o déficit fiscal anual.

Mas, para além da arrecadação, a estratégia tem implicações diretas para países exportadores como o Brasil. O impacto imediato ainda é limitado — apenas 12% das exportações brasileiras têm como destino os Estados Unidos —, mas o governo brasileiro corre o risco de romper a diversificação histórica da sua matriz comercial, concentrando de forma perigosa suas exportações na China.

Mesmo que o comércio com os EUA fosse completamente interrompido, o impacto no PIB brasileiro seria de cerca de 2%, um número relevante, mas não devastador. Ainda assim, o efeito simbólico e estratégico é o que mais preocupa: o Brasil pode se tornar mais vulnerável num cenário de disputa geoeconômica entre as duas maiores potências globais.


Os primeiros reflexos no setor produtivo brasileiro

A política americana já começa a produzir efeitos concretos sobre a indústria brasileira. A Taurus, tradicional fabricante de armamentos, anunciou o fechamento de uma unidade no Brasil e a abertura de uma nova fábrica nos Estados Unidos, com investimento de 500 milhões de dólares.

Outras empresas, como o grupo CSN, também seguiram esse caminho, adaptando suas operações para atender às exigências do mercado americano. A estratégia dos EUA é clara: não se trata apenas de repatriar empregos, mas de reduzir o déficit comercial. Quando um produto é fabricado no Vietnã ou no Brasil e vendido em território americano, ele entra nas estatísticas como importação, agravando o déficit. Por isso, Washington está pressionando empresas como a Apple e outras gigantes para que produzam dentro do país.

A diferença de competitividade entre a China e os EUA, conforme o palestrante ressalta, decorre de dois fatores principais, que serão explorados na próxima parte da análise.

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